Professor Investidor

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Talvez você, como eu, ao abrir o Instagram e ver seus Stories ou Reels receba posts patrocinados sobre cursos e/ou empresas de investimentos. Geralmente é chamando nossa atenção para o quanto nós precisamos aprender a investir, que nosso dinheiro pode trabalhar para nós, etc… etc…

Então você decide entender um pouco mais sobre isso, e um mundo… melhor, um universo se abre e você vê quantas maneiras distintas existem para começar, quantas opções possíveis se colocam diante de ti e então, para dar os primeiros passos, você começa a entender alguns conceitos básicos, como investimentos de curto, médio e longo prazo e seus riscos.

Por que estou falando disso? Ontem estava conversando com alguns colegas aqui na escola sobre o preço de alguns livros na versão digital e física e a conversa acabou concluindo com um pensamento comum a todos: Livro é um investimento, e por extensão, chegamos à ideia de que Educação é um investimento. E refletindo mais sobre isso, acabei fazendo um link com esse mundo dos investimentos e surgiu uma pergunta específica: como eu tenho enxergado a educação: um investimento de curto, médio ou longo prazo?

Acho que durante o início da carreira, eu enxergava mais como Médio Prazo, isto é, o resultado viria entre 3, 5 ou 8 anos. “Porque lá no futuro, quando vocês fizerem o vestibular…” ou então “Quando você for fazer um concurso ou entrevista de emprego…” eram pensamentos comuns nas minhas falas com os alunos. Projetava o resultado do processo para frente, com certa distância de onde nos encontrávamos, e esperava que o adolescente compreendesse e tivesse toda a paciência necessária para isso. O curto prazo não era observado e o longo prazo, ignorado!

Depois de 15 anos como docente (17, se contar o tempo de estágio), hoje percebo que a educação pode ter, sim, resultados de curto, médio e longo prazo. Mas para isso, como qualquer investidor, nós professores precisamos “observar o mercado“, compreender e prever as “tendências“, estudar meus “concorrentes“, ser criativo e inovador e ARRISCAR nos meus alunos.

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Se o mundo de hoje não é o mesmo que o de 5 anos atrás, calcule se será parecido com o de 10 ou 15 anos atrás!!! Minha conclusão: é imperativo que desenvolvamos essas habilidades de investidor enquanto professores atuantes hoje; é imperativo ver que a Educação tem resultados de curto, médio e longo prazo que não podem ser ignorados por nós; é imperativo que haja espaço para o erro, oportunidade de recomeço e prontidão para arriscar no potencial dos nossos alunos, mesmo que estes não se vejam capazes.

Presos num “Ciclo de Carnot”?

Há quatro anos que estou trabalhando como servidor público da Secretaria de Educação do DF. Contando o tempo trabalhado na rede privada de ensino, são 14 anos como professor (até o momento em que escrevo isso). E refletindo sobre como tem sido a taxa de rendimento do meu trabalho ao longo desses anos, me veio à mente o conceito do Ciclo de Carnot. Em 1824, o cientista Carnot idealizou uma máquina térmica que proporcionaria um rendimento máximo possível de se conseguir dentro do intervalo de temperaturas inicialmente conhecidas para aquela máquina em questão.

Por exemplo, para uma máquina que fosse operar entre 27°C (300K) e 127°C (400K), o rendimento máximo seria de 25% (1/4 da energia inicial seria aproveitada para gerar trabalho mecânico). Mas essa é uma máquina teórica, ideal. Usamos esse valor para comparar com o rendimento real da máquina. Se ela alcança 22% de rendimento, está ótima; se alcança 2,2%, está longe do potencial máximo.

Quanto mais afastadas estiverem as curvas vermelhas, maior será o rendimento máximo teórico do Ciclo

Com essa ideia um pouco mais clara, talvez você possa entender meu questionamento: ao longos dos anos, meu trabalho alcançou o máximo possível de rendimento ou não? E outra coisa: seria possível aumentar essa “barra” do potencial máximo possível, ou mesmo ultrapassá-lo? Estaria eu (e outros professores) preso num “Ciclo de Carnot” Educacional com as “temperaturas muito próximas”, e assim, o máximo possível seria algo muito baixo?

Não sei se ficou claro, rsrsrsrsrs, mas a ideia é se tenho sido eficaz ou eficiente. A eficiência seria fazer algo da maneira certa enquanto eficácia seria fazer o certo. Exemplo: Um vazamento está deixando uma poça de água em uma sala de aula. Um funcionário, então, pega um rodo, um pano e um balde para secar a sala. Após alguns minutos, a sala está seca. O funcionário foi eficiente, pois ele secou a água com as ferramentas certas do jeito certo. Outro funcionário, vendo o problema, descobre uma maneira acabar com o vazamento e o faz. Este foi eficaz, ao fazer o que era certo para aquela situação.

Percebe agora? O ciclo de Carnot acaba sendo uma alegoria para essa mesma situação. Eu posso estar sendo eficiente (chegando o mais próximo possível do limite máximo de rendimento da minha turma), fazendo da maneira correta o que me proponho a fazer. A pergunta é: o que me propus a fazer enquanto professor seria o “correto” dentro do atual contexto (social, econômico e tecnológico)? Isto é, minha prática pedagógica tem sido eficaz?

Às vezes acho que estamos presos nesse ciclo de rendimento baixo porque nós, professores, estamos segurando as “temperaturas” pro rendimento máximo possível ser pequeno de propósito, pois quanto maior o rendimento, maior o trabalho…

Propósito Glorioso!

Ontem pela manhã estava vendo os stories do Instagram e vi um vídeo, compartilhado por um amigo, de um adolescente falando sobre o que a escola deveria fazer pelos estudantes. Confesso que foram só 30s de uma entrevista que o jovem deu para um podcast famoso, o qual ainda não vi por completo, então a questão aqui é só compartilhar uma rápida reflexão que me passou pela cabeça após o vídeo.

A fala dizia “Quanto alunos de uma escola vão ser médicos, biólogos? Um de 1000! E quantos terão que usar dinheiro na vida? todos os mil!”. Me veio duas ideias aqui: a 1ª, sim eu concordo com a fala no sentido que não é propósito da escola preparar ninguém para ser uma profissão “x” ou “y” e enquanto a escola estiver focada nisso, realmente não faz sentido ir para a escola.

A segunda coisa é: ok, a escola começa a ensinar a todos a mexer com dinheiro, e aí … será que todos irão aprender a mexer com dinheiro só porque trocamos “Biologia” por “Finanças”? Os alunos irão se dedicar? Isso é de interesse de todos? E aquele aluno que quer ser médico, engenheiro ou professor? Acho que são perguntas igualmente válidas

O propósito da escola está além disso tudo, mas também passa por isso tudo. Esse é o desafio da escola hoje: ser relevante em um mundo infinitamente diverso culturalmente, economicamente e tecnologicamente. Mas no centro de de qualquer cenário, uma coisa é comum e constante: o aprender, e na minha humilde opinião, eis aí o propósito glorioso que o jovem espera ver na escola…

Seria Paulo Freire o “Expecto Patronum” ou “Avada Kedavra” da educação?

Ontem, 19 de setembro de 2021, o educador brasileiro Paulo Freire completaria 100 anos de idade. Pernambucano, nascido em 1921, Freire ficou conhecido no mundo inteiro por teorizar a sala de aula como mecanismo de transformação social. Recebeu prêmios internacionais por seus trabalhos na área educacional, tem seu nome adotado por muitas instituições além de ser cidadão honorário de várias cidades no Brasil e no exterior. A Paulo Freire foi outorgado o título de doutor Honoris Causa por vinte e sete universidades.

Todo professor já ouviu falar de Paulo Freire (sejam coisas boas ou coisas ruins), seja na graduação ou no dia-a-dia da escola. Eu já ouvi colegas o chamando de “paternalista” e outros de “exemplo”. Enfim, um nome comumente inserido em conversas e debates dentro da área educacional, mas difícil de se ouvir em outros contextos. Contudo, ontem as redes sociais (ao menos nas minhas) estiveram abarrotadas com publicações a respeito de Paulo Freire, e muitas por pessoas que não são professores. E me perguntei que fenômeno foi esse?

Não vou criticar a obra de Paulo Freire nesse texto, nem para o bem nem para o mal. Sabe o por quê? Porque eu NÃO ESTUDEI Paulo Freire na minha graduação. Simples assim! Eu tive contato com um de seus livros (Extensão e Comunicação – 1971) para elaboração da minha dissertação de mestrado que era focada na EJA e só! Paulo Freire publicou 37 obras (ao menos é o que diz o blog http://paulofreireufmg.blogspot.com/) e eu só tive contato com uma delas. Minha conclusão: não sou capaz de criticar sua obra e acho que essa seja a situação de muitos colegas de profissão (e não colegas) que, devido o nosso atual contexto político dicotomizado, se inflamam em suas posições e se valem das “figuras históricas” sem realmente conhecer a história.

No universo literário de Harry Potter, o feitiço “Expecto Patronum” é invocado para emanar uma alta concentração de boas energias capaz de espantar/anular o mal. No mesmo universo, também existe um outro feitiço chamado “Avada Kedavra“, o qual é fatal ao ser lançado contra uma vítima. E é isso que tenho visto: o nome de Paulo Freire ser proferido dentro dessa perspectiva “quase mística”, como um feitiço do bem ou do mal, ou como uma benção ou como uma maldição que no fimdas contas ninguém realmente chegou a beber das fontes original.

Repito: Não tenho nenhuma posição quanto ao trabalho e/ou a pessoa de Paulo Freire. Não vejo minha prática educacional influenciada diretamente por ele, mas pode que ser tenha sido indiretamente, não sei… Não sei dizer se o que penso tem algo em comum ou discordante das suas teorias, mas insisto: uma reflexão crítica, genuína e científica só surgirá em um meio onde os dois lados tenham sido exaustivamente ouvidos, estudados e debatidos e aí sim, cada um poderá invocar seu “Expecto Patronum” ou seu “Avada Kedavra” com propriedade.

Inércia: a primeira Lei de … Galileu?

A Inércia talvez seja um daqueles conceitos que todo mundo lembra, mesmo aqueles que não gostam/gostaram das aulas de Física que tiveram. É uma ideia aparentemente simples e para alguns até óbvia, e comumente associada somente à Isaac Newton. A questão é que a ideia sistematizada por Newton, e ampliada, tem em sua origens o matemático e astrônomo italiano Galileu Galilei.

Conta-se que Galileu realizou alguns experimentos na Torre de Piza, demonstrando que dois corpos de pesos diferentes não caíam em tempos diretamente proporcionais ao seus pesos. Com pequenas diferenças provocadas pela resistência do ar, os dois corpos caíam praticamente ao mesmo tempo. Isso foi um cruzado direto na cara da teoria aristotélica vigente na época. O problema? Era a teoria defendida pela Igreja, pela qual essa instituição perseguiu e matou por certo tempo. Mas isso é uma conversa para outro momento…

A questão aqui é o papel da experimentação no trabalho de Galileu. Sua visão sobre como analisar os fenômenos através da experimentação é que é uma revolução incrível! Dentro dessa perspectiva, Galileu começou um estudo mais profundo da queda dos corpos através de planos inclinados.

Galileu estava mais interessado em como as coisas se movem do que em por que elas o fazem. Ele mostrou que a experimentação, mais do que a lógica, é o melhor teste de conhecimento. Aristóteles foi um astuto observador da natureza, e tratou mais com problemas que o cercavam do que com casos abstratos que não ocorriam em seu ambiente. O movimento sempre envolve um meio resistivo, tal como ar ou água. Ele acreditava ser impossível a existência de um vácuo e, portanto, não considerou seriamente o movimento na ausência de qualquer meio interagente. Por isso, era fundamental para Aristóteles que sempre fosse necessário empurrar ou puxar um objeto para mantê-lo em movimento.¹

Ao estudar o movimento em planos inclinados (figura acima), Galileu percebeu que quanto mais lisa fosse a superfície, mais próxima da altura inicial a bolinha conseguia subir. Sem esse atrito, concluiu, a esfera sempre chegaria na mesma altura, mesmo que precisasse percorrer um caminho mais longo. Ao descer o plano, a bolinha ganhava “rapidez” e ao subir o plano, perdia “rapidez” até chegar na mesma altura de antes. E se, após descer o plano, não tivesse outro para subir, mas um plano horizontal muito longo…até onde iria a bolinha? Nas palavras de Galileu:

“Se eu disponho de um plano horizontal longo, quão longe deve ir a bola para alcançar a mesma altura? Para sempre – ela jamais alcançará sua altura inicial” ²

O conceito de Galileu de inércia desacreditou a teoria de Aristóteles do movimento. Aristóteles de fato não reconheceu a ideia de inércia, porque deixou de imaginar como seria o movimento sem atrito. Em sua experiência, todo movimento estava sujeito a resistência e ele fez deste o fato central de sua teoria do movimento. Uma aplicação do conceito de Galileu da inércia revelaria que nenhuma força era necessária para manter a Terra movendo-se para a frente. O caminho estava aberto para Isaac Newton sintetizar uma nova visão do universo.

¹HEWITT, Paul G. Física conceitual. Tradução: Trieste Freire Ricci – 12. ed. Porto Alegre : Bookman, 2015.

²GALILEI, Galileu. Dialogues Concerning Two New Sciences. Translated from the Italina and Latim to English by Henry Crew and Alfonso de Salvio. New York: The Macmilliam Company, 1914.